Hermínio Felizardo...

Considerado por muitos, o cineasta maldito, João César Monteiro era e é, pois a sua obra perdura, um dos meus cineastas portugueses favoritos.

“Recordações da casa amarela” e “A comédia de Deus”, estão entre as longas-metragens da minha eleição. Ambos os filmes estão imbuídos de um humor e uma ironia de fino e subtil recorte.

A sua imagem de marca era o cigarro eternamente esquecido entre os dedos esfíngicos.

Por vezes, o cigarro auto consumia-se em cinza, cujo morrão desafiava as leis da física e permanecia até ao derradeiro encontro com o filtro, com a forma texturada do que fora antes um cigarro.

Quando o recordo, é essa a imagem que emerge: olhos esbugalhados, com um discurso aparentemente sereno e comedido, mesmo quando ofendia deliberadamente os jornalistas que o entrevistavam.

Recordo uma entrevista para a televisão. Quando questionado para a forte componente erótica do filme, “ A comédia de Deus” entre outras coisas disse:

-Ó minha senhora: nesta vida tudo é comestível! A senhora não sabe isso?

Enquanto falava, o tal cigarro permanecia intacto entre os dedos da mão estática, embora reduzido a cinza.

Não vi um dos seus derradeiros filmes, “ Branca de Neve”, mas parece que também ninguém viu.

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